As ações de conservação da marmota-da-Ilha de Vancouver, uma espécie insular em risco de extinção

A marmota-da-Ilha de Vancouver (Marmota vancouverensis) é um roedor endêmico da ilha de mesmo nome, localizada na província da Colúmbia Britânica, Canadá. Essa espécie representa um importante caso de conservação, devido à sua distribuição extremamente restrita, à severa redução populacional observada nas últimas décadas e aos esforços combinados de organismos governamentais e não-governamentais para garantir sua sobrevivência.

Distribuição geográfica e habitat

A marmota-da-Ilha de Vancouver é endêmica da ilha de Vancouver, na Colúmbia Britânica, Canadá, não ocorrendo naturalmente em outro local. Ela ocupa principalmente trechos de encostas montanhosas, em altitudes que variam aproximadamente entre 900 e 1.500 metros acima do nível do mar.
O seu habitat natural consiste de pradarias subalpinas livres ou com escassa cobertura arbórea, criadas por processos naturais como avalanches, o deslocamento lento de neve ou o fogo, que mantêm matas baixas e áreas abertas. Essas clareiras proporcionam visibilidade para detecção de predadores, solos adequados para a escavação de tocas e vegetação herbácea que compõe sua dieta. Além disso, a espécie pode utilizar clareiras artificiais criadas por atividades humanas, como áreas de esqui ou de mineração, porém essas “alternativas” muitas vezes apresentam características que dificultam sua persistência a longo prazo.

Características biológicas e ecológicas

A marmota-da-Ilha de Vancouver difere de outras marmotas por detalhes morfológicos e comportamentais. Adultos apresentam pelagem castanha-chocolate com manchas esbranquiçadas no queixo, no peito e na testa — contrastando com outras espécies de marmota que normalmente têm pelagem acinzentada ou mais clara. O peso de adultos varia entre cerca de 3 e 7 kg, dependendo do sexo e da época do ano.
Em termos de comportamento, formam colônias familiares compostas por um macho adulto, uma ou duas fêmeas adultas, juvenis e filhotes do ano. A dispersão dos machos jovens ocorre entre os 2 e 3 anos de idade. Trata-se de uma espécie fossorial e diurna, que passa uma parte significativa do tempo em tocas — tanto para descanso como para hibernação — e o restante para forrageamento, descanso vigilante ou interação social. A marmota alimenta-se principalmente de gramíneas, herbáceas e brotos em prados subalpinos, com preferência por flores, frutos e brotos frescos ao longo da estação ativa. Os principais predadores naturais incluem o lobo-cinzento (Canis lúpus), a onça-parda (Puma concolor) e a águia dourada ( Aquila chrysaetos), sendo a predação responsável por cerca de 83% da mortalidade anual. A hibernação se estende geralmente de finais de setembro até finais de abril.

Declínio populacional e fatores de ameaça

Historicamente, a marmota tinha baixa densidade populacional em razão da escassez de habitat adequado, porém sofreu uma drástica redução nas últimas décadas. Um levantamento de 1984 estimou entre 300 e 350 indivíduos; nas décadas seguintes ocorreu um declínio abrupto, alcançando aproximadamente 70 indivíduos em 1997. A avaliação mais recente, de 2019, indicou apenas entre 88 e 101 indivíduos maduros em vida livre. Entre os fatores que contribuíram para esse declínio estão a predação elevada por grandes predadores, que se intensificou com as alterações no ecossistema; a modificação do habitat provocada pelo corte raso e por outras atividades humanas, que criam clareiras temporárias e se regeneram em florestas densas, tornando-se armadilhas ecológicas; as mudanças climáticas, que projetam uma perda de até 97% do habitat adequado até 2080 em cenários pessimistas; e os efeitos de populações pequenas e isoladas, com baixa variabilidade genética, dispersão limitada entre colônias e dificuldade de reprodução e sobrevivência. Esses fatores interagem de forma cumulativa, explicando o alto risco de extinção que ainda pesa sobre a espécie.

Ações de conservação: programas, ONGs e órgãos governamentais

Diante do risco crítico enfrentado por esta espécie, foram implementadas várias iniciativas de conservação envolvendo entidades públicas e privadas. Em 1998, foi criada a Marmot Recovery Foundation (MRF) com o objetivo de gerir programas de reprodução em cativeiro e reforço de populações selvagens da marmota-da-Ilha de Vancouver. Centros de reprodução foram montados, por exemplo, no Zoológico de Calgary e no Zoológico de Toronto, além de uma instalação especializada na Ilha de Vancouver. Através dessa ação, novas colônias foram estabelecidas em montanhas adicionais, por exemplo, saltando de cerca de 5 colônias em 2003 para 25 ou mais em 2017.

O governo canadense, através do Committee on the Status of Endangered Wildlife in Canada (COSEWIC) e do Species at Risk Act (SARA), designou a espécie como em perigo (EN) desde 1978, com confirmações posteriores até 2019. A Colúmbia Britânica criou ainda reservas ecológicas específicas, como a Haley Lake Ecological Reserve e a Green Mountain Wildlife Critical Habitat Area,  para garantir a conservação de habitats críticos. Atualmente a IUCN classifica a espécie como Criticamente em Perigo de Extinção (CR).

Além da MRF, organizações como a Nature Canada contribuem para campanhas de sensibilização, mobilização de recursos e divulgação da situação da marmota-da-Ilha de Vancouver através do envolvimento de voluntários, educação ambiental e ações para influenciar políticas públicas, busca-se reforçar a proteção legal dos ecossistemas e promover a participação da sociedade na conservação.

Relatórios como o de 2019 da COSEWIC documentam os progressos, bem como os retrocessos recentes: embora tenha havido crescimento populacional entre 2008 e 2013, entre 2013 e 2017 ocorreu nova queda no número de indivíduos maduros, indicando que os esforços ainda enfrentam desafios significativos.

Desafios e perspectivas futuras

Apesar dos avanços, persistem desafios relevantes para garantir a viabilidade de longo prazo da marmota-da-Ilha de Vancouver. A necessidade de manter ou aumentar taxas de sobrevivência de adultos, aumentar o número de indivíduos reintroduzidos, ampliar o habitat adequado e reduzir os impactos da predação e das mudanças climáticas são centrais para os planos de conservação. A MRF tem como meta estratégica uma população de aproximadamente 600 indivíduos em habitat selvagem, distribuída em colônias centrais nos setores sul, central e norte da ilha. Também é indispensável incorporar métodos adaptativos, como manejo de predadores, monitoramento genético, restauração de tocas adequadas e controle de armadilhas ecológicas. A colaboração entre governos, ONGs, comunidades locais e o setor privado será decisiva.
Em termos de política pública, a meta federal canadense de proteger 30% das terras, oceanos e água doce até 2030 constitui uma oportunidade para fortalecer a proteção de ecossistemas que sustentam esta espécie.

A marmota-da-Ilha de Vancouver representa um caso emblemático de conservação de uma espécie altamente ameaçada, com distribuição restrita, elevado risco de extinção e forte dependência de intervenções humanas para sua sobrevivência. Sua biologia particular — como tolerância de habitat específica, hibernação prolongada e vulnerabilidade à predação — torna-a especialmente susceptível a mudanças ambientais e à degradação de habitat. Os esforços coordenados de reprodução em cativeiro, introdução, proteção de habitat e ações para influenciar políticas públicas têm demonstrado resultados positivos, mas ainda insuficientes para garantir sua recuperação plena. Assim, a combinação de ações de conservação, engajamento público, financiamento contínuo e políticas de proteção ambiental integradas torna-se essencial. O futuro da espécie dependerá de sua capacidade de se manter em número suficiente em ambientes naturais, de resistir à predação e de adaptar-se às mudanças do clima e da paisagem.

Fontes: Animal Diversity, Animalia.Bio, Marmot Recovery Foundation, Biodiversity4all, Government of Canada, Nature Canada, British Columbia Magazine, Marmot Recovery Foundation 

Fotos: Marmota de VAncouver_ iStock, segunda e terceira foto:_by Frank Fichtmueller, quarta foto:_by Kyle Kittelberger