Em meio Ă s florestas nebulosas e aos pĂĄramos andinos da ColĂŽmbia, vive um dos beija-flores mais enigmĂĄticos e ameaçados do planeta: o colibri-do-sol (Coeligena orina). EndĂȘmico das regiĂ”es elevadas da Cordilheira Ocidental, esse pĂĄssaro de plumagem iridescente foi, por dĂ©cadas, conhecido apenas por alguns poucos espĂ©cimes preservados em museus. Sua redescoberta no inĂcio dos anos 2000 trouxe nĂŁo apenas interesse cientĂfico, mas tambĂ©m a consciĂȘncia de sua vulnerabilidade extrema. Com uma população estimada em poucas centenas de indivĂduos, a espĂ©cie enfrenta ameaças crescentes, como desmatamento, mineração e degradação de habitat.
CaracterĂsticas morfolĂłgicas
O colibri-do-sol Ă© uma espĂ©cie de beija-flor da subfamĂlia
Trochilinae, endĂȘmica da Cordilheira Ocidental dos Andes, na
ColÎmbia. Trata-se de uma ave de porte médio entre os beija-flores,
medindo cerca de 14 cm de comprimento e com peso em torno de 7 g, variando
levemente entre machos e fĂȘmeas. O macho Ă© particularmente notĂĄvel por sua
plumagem iridescente: testa azul-esverdeada a verde-dourada, coroa e manto
negros aveludados, dorso verde com reflexos escuros, e uma impressionante
mancha azul-cobalto no centro da garganta. As penas da garupa e cauda superior
exibem um tom verde-dourado brilhante, enquanto a cauda Ă© verde-claro.
As fĂȘmeas, embora menos coloridas, tambĂ©m apresentam beleza prĂłpria. TĂȘm
a cabeça e o dorso verdes, com pontas enegrecidas nas penas, criando um efeito
escamoso. A garganta Ă© castanho-amarelada com manchas verdes nas laterais, o
ventre Ă© verde-dourado com tons mais opacos, e as penas da cauda exibem menos
iridescĂȘncia que as dos machos. Ambos os sexos possuem bico fino e preto de
aproximadamente 33 mm, olhos castanhos escuros e pernas pretas.
Habitat e distribuição
O colibri-do-sol habita altitudes superiores a 3.000 metros,
sendo encontrada em apenas uma dĂșzia de locais na Cordilheira Ocidental da
ColÎmbia. Seu ambiente preferido inclui zonas de transição entre florestas
Ășmidas andinas e o pĂĄramo, ĂĄreas de matagal prĂłximo Ă linha do pĂĄramo e
florestas de alta altitude. Hå registros da espécie em diversos pontos
especĂficos: PĂĄramo de Frontino, Parque Nacional Natural (PNN) Las OrquĂdeas,
Farallones del CitarĂĄ, Cerro Montezuma (Risaralda), JardĂn (Antioquia), Cerro
Plateado, Alto Ventanas e Cerro TatamĂĄ (Risaralda e ChocĂł). Em algumas dessas
åreas, como os penhascos de Citarå, a espécie é extremamente rara, sendo
avistada apenas algumas vezes ao longo de extensos perĂodos de monitoramento.
Alimentação e comportamento
O colibri-do-sol Ă© uma espĂ©cie predominantemente nectarĂvora, com
forte preferĂȘncia por flores das famĂlias Ericaceae e Campanulaceae. No PĂĄramo
de Frontino, costuma visitar regularmente plantas do gĂȘnero Centropogon,
comuns nas bordas e clareiras das florestas andinas. No entanto, sua dieta nĂŁo
se restringe ao néctar: anålises de estÎmagos revelaram a presença de pequenos
artrĂłpodes, como vespas, aranhas e dĂpteros, demonstrando um comportamento
alimentar mais generalista do que se supunha anteriormente.
Quanto à reprodução, foram encontrados ninhos da espécie no PNN de
TatamĂĄ, cada um com dois ovos. Os ninhos estavam suspensos por raĂzes finas em
faces rochosas, a cerca de 3 metros do solo, prĂłximos a fontes de ĂĄgua — um
padrĂŁo que sugere forte dependĂȘncia de micro-habitats especĂficos. IndivĂduos
juvenis foram observados em diferentes Ă©pocas do ano, indicando uma possĂvel
reprodução nĂŁo restrita a uma estação Ășnica.
Ameaças Ă sobrevivĂȘncia
Com uma população estimada entre 250 e 2.500 indivĂduos adultos, o
colibri-do-sol é considerado uma espécie em perigo (EN) na Lista
Vermelha da IUCN. A principal ameaça Ă sua sobrevivĂȘncia Ă© a perda de habitat.
Mesmo em ĂĄreas protegidas, o desmatamento para atividades agropecuĂĄrias,
extração madeireira e expansão urbana avança de maneira preocupante. No Påramo
de Frontino, além do desmatamento, a possibilidade de mineração de ouro,
zinco e cobre representa um risco iminente. Embora a exploração mineral ainda
não esteja em curso, sua autorização e o frågil controle territorial aumentam a
vulnerabilidade da regiĂŁo.
Outro fator agravante é a presença de propriedades privadas na região do
pĂĄramo, onde prĂĄticas inadequadas como a criação de gado em ĂĄreas Ăngremes
substituem a vegetação nativa por pastagens de baixa qualidade. IncĂȘndios
provocados ou acidentais tambĂ©m tĂȘm causado destruição, como o ocorrido em
janeiro de 2010, que devastou 110 hectares de vegetação nativa, incluindo o
frailejón (Espeletia), espécie-chave do ecossistema de påramo.
Medidas de conservação
Apesar das ameaças, hå iniciativas relevantes voltadas à conservação da
espécie. O colibri-do-sol estå presente no Parque Nacional Natural
TatamĂĄ, uma das ĂĄreas protegidas que abrigam seu habitat. No Ăąmbito regional, a
entidade ambiental Corantioquia criou trĂȘs reservas de manejo
especial com o objetivo de preservar as ĂĄreas de altitude da Cordilheira
Ocidental: Cuchilla JardĂn-TĂĄmesis (1.075 ha), FalĂ©sias de CitarĂĄ (1.435 ha) e
Alto de San JosĂ©–Cerro Plateado (700 ha).
No setor privado, destaca-se a atuação da Fundación ProAves, responsåvel pela criação da Reserva Colibrà del Sol no
Påramo de Frontino, com 582 hectares de proteção de florestas e ecossistemas de
altitude. A bioconservancy também contribui com a conservação da
espécie, por meio da Reserva La Mesenia, que protege 200 hectares de habitat no
sudoeste de Antioquia. Além disso, hå propostas em andamento para expandir o
Parque Nacional Natural Las OrquĂdeas, de forma a incluir o PĂĄramo de Frontino
em sua ĂĄrea protegida.
Esses esforços, embora relevantes, ainda enfrentam desafios para
garantir a eficåcia na conservação da espécie, especialmente diante do avanço
da mineração, do turismo desordenado e da ausĂȘncia de fiscalização
efetiva em algumas regiĂ”es crĂticas.
A redescoberta do colibri-do-sol em 2004, após décadas sem ser
identificado, confirmou seu status como espécie vålida e destacou sua
importĂąncia ecolĂłgica para os ecossistemas andinos colombianos. No entanto, sua
existĂȘncia continua ameaçada por um conjunto de fatores que demandam açÔes
urgentes e coordenadas. A sobrevivĂȘncia dessa espĂ©cie rara e belĂssima
dependerĂĄ da articulação entre polĂticas pĂșblicas, comunidades locais, ONGs
e instituiçÔes cientĂficas comprometidas com a proteção da biodiversidade de
alta montanha. Proteger o colibri-do-sol é proteger também os
frĂĄgeis e valiosos ecossistemas andinos dos quais ele depende.
Fontes: Asociacion Colombiana de Ornitologia, Ebird, Avibase, Datazone.birdlife, Biodiversity4all, FundaciĂłn ProAves, Birds Colombia, Jungle Dragon
Fotos: Colibri-do-sol_macho adulto_by Guillermo Nagy.jpeg e segunda foto: Colibri-do-sol_fĂȘmea_by Leandro Vargas.webp e terceira foto: Colibri-do-sol_macho_by Guillermo Nagy.jpg e quarta foto: Colibri-do-sol_FĂȘmea_by Alonso Quevedo.png