Os esforços e desafios para salvar o crocodilo-do-Orinoco da extinção


O crocodilo-do-Orinoco (Crocodylus intermedius) ou caimán llanero é uma das maiores e mais ameaçadas espécies de crocodilianos do mundo. Endêmico das bacias hidrográficas da Colômbia e da Venezuela, este predador de topo desempenha papel essencial no equilíbrio ecológico dos ecossistemas aquáticos em que vive. Ao longo do século XX, a intensa caça por sua pele e a destruição de seu habitat provocaram um declínio populacional de mais de 99%, colocando-o na categoria de “Criticamente Ameaçado” da Lista Vermelha da IUCN. Atualmente, a estimativa mais otimista aponta menos de 300 indivíduos adultos em estado selvagem.

Biologia e ecologia da espécie

O crocodilo-do-Orinoco é um dos maiores répteis do continente americano, podendo atingir até sete metros de comprimento. Durante sua juventude, alimenta-se de pequenos peixes, invertebrados e anfíbios. À medida que cresce, sua dieta inclui aves, mamíferos e peixes de médio porte, controlando populações de predadores como piranhas e bagres, o que o caracteriza como uma espécie guarda-chuva. Além disso, seus excrementos enriquecem os rios com nutrientes que alimentam o fitoplâncton e, consequentemente, toda a cadeia alimentar aquática.

As fêmeas atingem a maturidade sexual com cerca de 2,5 metros e constroem ninhos nas margens de rios, onde depositam de 32 a 44 ovos. A eclosão ocorre no início da estação chuvosa. A movimentação dos crocodilos contribui ainda para a manutenção do fluxo dos rios, evitando o assoreamento durante os períodos de seca.




As causas do declínio

Entre 1920 e 1950, mais de 250 mil peles de crocodilos foram comercializadas internacionalmente, especialmente na Europa, nos Estados Unidos e no Japão. Essa exploração desenfreada levou a espécie ao colapso. Apesar da proibição da caça comercial desde 1970, a espécie continua sob ameaça. A caça ilegal persiste, especialmente em áreas rurais da Venezuela, onde a crise econômica tem levado parte da população à caça por subsistência. Filhotes e ovos também são frequentemente saqueados. Além disso, a fragmentação de habitat, a poluição dos rios, a construção de represas e canais e o avanço da fronteira agrícola ameaçam os poucos grupos restantes.

Iniciativas de conservação na Venezuela

Na Venezuela, o Programa Nacional de Conservação do crocodilo-do-Orinoco está ativo há mais de três décadas, combinando esforços de centros de reprodução, universidades, comunidades locais e organizações governamentais. A Fazenda Masaguaral, criada oficialmente em 1984 e operada em parceria com a FUDECI desde 2000, é a única instalação que realiza solturas contínuas há 24 anos. Sozinha, já libertou 3.248 indivíduos, o que representa cerca de 35% do total nacional. A criação dos filhotes envolve tanques especializados, incubadoras, alimentação supervisionada e soltura estratégica.

O Zoológico Leslie Pantin e o centro Hato Masaguaral também contribuem com reprodução e incubação de ovos. Em abril de 2025, 200 juvenis foram libertados no rio Capanaparo. Entretanto, os próprios responsáveis reconhecem que a pobreza extrema leva muitas dessas crias à morte precoce, seja por caça ou por necessidade alimentar de comunidades vulneráveis.

A experiência da Colômbia

Na Colômbia, os esforços têm se intensificado desde a década de 1970. A Estação de Biologia Tropical Roberto Franco (RFTBS), vinculada à Universidade Nacional da Colômbia, abriga mais de 600 crocodilos, tornando-se o maior repositório da espécie no mundo. Desde 2015, reintroduções progressivas têm sido realizadas em áreas protegidas. A meta do Plano de Ação Interinstitucional de 2022 é estabelecer três populações viáveis, com pelo menos cinco fêmeas reprodutivas, em até 15 anos.

Um dos marcos mais relevantes ocorreu em abril de 2023, com a soltura de 14 crocodilos adultos no Parque Nacional El Tuparro. Para garantir o sucesso dessas reintroduções, os animais passaram por uma adaptação rigorosa, sendo treinados para caçar em ambientes sem interferência humana.


Genética e viabilidade populacional. O manejo genético tem sido essencial para o sucesso da conservação ex situ e da reintrodução. Estudos realizados com 551 crocodilos da RFTBS, demonstraram que a população possui diversidade genética suficiente para sustentar reintroduções bem-sucedidas. Esses dados, obtidos por meio de marcadores moleculares, permitem identificar indivíduos com maior potencial de sobrevivência e reprodução, além de evitar os riscos da endogamia.

A conservação do crocodilo-do-Orinoco tem sido possível graças à articulação de diferentes instituições: universidades, ONGs como a WCS Colômbia, centros como o Bioparque Wisirare e agências governamentais, como os Parques Nacionais Naturais da Colômbia e o Ministério do Ecossocialismo da Venezuela. O Projeto Vida Selvagem tem liderado adaptações em instalações para permitir o ciclo completo de reprodução e libertação dos animais em reservas naturais privadas e públicas.

Desafios e caminhos para o futuro

Apesar dos avanços, a situação do crocodilo-do-Orinoco permanece crítica. A distribuição altamente fragmentada, o impacto das atividades humanas e a caça ainda impedem que a espécie se recupere naturalmente. O número de indivíduos viáveis em estado selvagem continua muito baixo, e muitas áreas sequer têm dados atualizados sobre a presença da espécie.

Ainda assim, há razões para esperança. A continuidade dos programas de reprodução em cativeiro, associada a estratégias de educação ambiental, proteção de habitats e controle da caça ilegal, pode promover a recuperação da espécie nas próximas décadas. A conservação do crocodilo-do-Orinoco, além de salvar um dos maiores répteis do mundo, representa um compromisso com a manutenção da diversidade ecológica dos rios sul-americanos.

Fontes: Infobae, Libro Rojo de la fauna venezuelana, WCS Colômbia, Ladera Sur, Instituto Humboldt, Econoticias, Mongabay, Fundación Biodiversidad 

Fotos: Crocodilo-do-Orinoco_Canal Llanero; segunda foto: Crocodilo-do-Orinoco_by Álvaro Velasco.png e terceira foto:_by Álvaro Velasco.png