A descoberta do sapinho-pingo-de-ouro-do-tabuleiro: um pequeno gigante da biodiversidade


Uma colaboração de cientistas de várias instituições brasileiras acaba de revelar a existência de uma nova espécie de anfíbio que a ciência antes desconhecia. Esta nova espécie, batizada de Brachycephalus tabuleiro ou sapinho-pingo-de-ouro-do-tabuleiro, foi descoberta no Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, uma área protegida administrada pelo Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) com o apoio do Governo do Estado de Santa Catarina. A espécie foi descrita na revista científica Vertebrate Zoology no dia 14 de julho de 2023, fruto do trabalho de sete cientistas dedicados à investigação da biodiversidade da região.

Todas as espécies do gênero Brachycephalus são endêmicas da Mata Atlântica

O gênero Brachycephalus, ao qual pertence a nova espécie, é composto por pequenos anfíbios endêmicos da Mata Atlântica, distribuídos desde a Bahia até o estado de Santa Catarina. Com a adição do sapinho-pingo-de-ouro-do-tabuleiro, o gênero agora conta com 40 espécies, todas endêmicas da Mata Atlântica e que ocorrem principalmente em florestas ombrófilas, caracterizadas por vegetação densa e chuvas abundantes.

Os membros desse gênero são conhecidos por sua miniaturização, com corpos de apenas um centímetro e uma redução notável no número de ossos e dedos funcionais. Tal como as outras espécies do gênero, o sapinho-pingo-de-ouro-do-tabuleiro apresenta essa miniaturização, mas destaca-se pela sua coloração única, com uma combinação de tons de verde-oliva, laranja e amarelo. Esses pequenos sapos habitam apenas as áreas montanhosas acima de 800 metros de altitude.

Nova espécie é endêmica do topo das montanhas da Serra do Tabuleiro em Santa Catarina

Esta espécie de sapinhos-pingo-de-ouro é considerada microendêmica dos topos das montanhas da Serra do Tabuleiro, não ocorrendo em nenhum outro lugar do planeta. Eles são mais vocais durante o amanhecer e o anoitecer, e sua atividade é altamente influenciada pelo clima: são mais ativos durante o dia em dias chuvosos e nublados, enquanto tendem a ter pouca ou nenhuma atividade e vocalização em dias ensolarados e quentes.

Sapinho-pingo-de-ouro-do-tabuleiro é ameaçado por diversas atividades antropogênicas

No entanto, apesar de sua natureza singular e importante contribuição para a biodiversidade da Mata Atlântica, o sapinho-pingo-de-ouro-do-tabuleiro, assim como muitas outras espécies do gênero, pode estar ameaçado. Sua localidade-tipo adjacente ao Parque Estadual da Serra do Tabuleiro é afetada por diversas atividades agrícolas, inclusive a presença de plantas exóticas. Estes fatores podem alterar a quantidade e a qualidade da serapilheira, ou camada de folhas caídas, que é fundamental para a sobrevivência da espécie.

Além disso, conflitos fundiários e atividades antropogênicas, como apicultura, pecuária, e plantio de eucalipto, no Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, podem pôr em risco a sobrevivência da espécie. Estes problemas tornam-se ainda mais agravantes quando se considera que o município de São Bonifácio tem conflitos de uso do solo com ocupações irregulares e processos de desapropriação inacabados no parque.

Mudanças climática também ameaçam a nova espécie

A descoberta do sapinho-pingo-de-ouro-do-tabuleiro traz outro problema a ser enfrentado. Estudos prévios mostram que as montanhas do habitat do sapinho-pingo-de-ouro funcionam como ilhas de altitude, onde áreas elevadas possuem condições ambientais distintas das áreas mais baixas. Nestas "ilhas", até topos de montanhas geograficamente próximos podem abrigar espécies diferentes de Brachycephalus.

Este fenômeno, por um lado, destaca a incrível diversidade biológica da Mata Atlântica, onde pequenas variações de altitude podem levar à evolução de espécies distintas. Por outro lado, isto também significa que tais espécies podem ser altamente vulneráveis a mudanças em seu ambiente. Com o aumento do aquecimento global, uma das principais consequências das mudanças climáticas é a alteração dos padrões climáticos locais. Isso pode se traduzir em mudanças nas condições das "ilhas de altitude" onde o Brachycephalus tabuleiro e outras espécies de seu gênero vivem.

Por exemplo, se as mudanças climáticas tornarem uma área mais seca, isso pode afetar a qualidade e a quantidade da serapilheira, ou camada de folhas caídas, fundamental para a sobrevivência do sapinho-pingo-de-ouro. Da mesma forma, mudanças na temperatura podem tornar um habitat anteriormente hospitaleiro inabitável para uma espécie que evoluiu para sobreviver dentro de uma faixa estreita de condições climáticas.

Mudanças climáticas podem aumentar as ameaças das atividades antropogênicas

Além disso, as mudanças climáticas podem agravar outros problemas. Por exemplo, períodos mais longos de seca podem tornar a agricultura mais difícil, levando à expansão de atividades agropecuárias para áreas de montanha previamente não utilizadas, trazendo consigo as ameaças de desmatamento e invasão de espécies exóticas.

Novas espécies que existem e ainda não descobertas podem deixar de existir antes de se tornarem conhecidas

E há outro aspecto a considerar: a possibilidade de existirem mais espécies de Brachycephalus ainda desconhecidas. Se cada "ilha de altitude" tem o potencial de abrigar uma espécie única, quantas espécies estão lá fora que ainda não foram descobertas? E quantas podem desaparecer devido às mudanças climáticas antes mesmo de serem descobertas?

Por todas estas razões, a descoberta do sapinho-pingo-de-ouro-do-tabuleiro é mais do que apenas uma adição à nossa lista de espécies conhecidas. Ela é um lembrete da rica biodiversidade do planeta, da fragilidade dessas espécies diante das mudanças climáticas, e da urgência em tomar medidas para mitigar essas mudanças.

Dada a possibilidade de ameaça à espécie e a necessidade de conservação, os pesquisadores defendem que estudos futuros devem quantificar a distribuição completa do sapinho-pingo-de-ouro-do-tabuleiro e avaliar as tendências populacionais. Esses estudos serão fundamentais para avaliar com precisão seu estado de conservação e implementar medidas de proteção eficazes.

Fontes: G1Globo, Vertebrate Zoology , IMA, Portal da Ilha, Jornal da Fronteira,Miami Herald 

Fotos: Sapinho-pingo-de-ouro-do-tabuleiro_  by Diego-Jose-Santana (as duas fotos)