Em meio à especulação imobiliária na Mata Atlântica, formigueiro-do-litoral luta pela sobrevivência


 Exclusivamente encontrado em uma restrita região da Mata Atlântica, no Estado do Rio de Janeiro, o Formigueiro-do-litoral, também conhecido como formigueiro-da-restinga (Formicivora littoralis), enfrenta uma batalha pela sobrevivência.

O formigueiro-do litoral, cujo tamanho médio é de 14 cm e peso de 15 gramas, apresenta dimorfismo sexual, pois possui características distintas em cada gênero. O macho apresenta plumagem negra com detalhes brancos nas asas e na cauda, curiosamente adornada por pequenos círculos. Já a fêmea, exibe a face clara com uma máscara negra sobre os olhos; seu dorso é castanho e o ventre, bem claro.

A espécie vive nas restingas do litoral do Estado do Rio de Janeiro

O formigueiro-do-litoral é habitante das restingas, um tipo de vegetação de planície costeira arenosa associada à Mata Atlântica, e formações litorâneas do litoral fluminense, onde prefere as áreas próximas à praia. Este ambiente, repleto de vegetação espinhosa, forma uma frágil, mas quase impenetrável, muralha de galhos secos, rica em vegetação herbácea e bromélias. Aqui, a ave locomove-se por meio de saltos, no solo ou na ramaria, realizando ocasionalmente voos curtos.

Apesar de seu nome, a dieta do formigueiro-do-litoral não se limita a formigas. Este pássaro se alimenta de diferentes tipos de invertebrados que vivem na restinga, incluindo larvas, mariposas e coleópteros. Ele se hidrata principalmente do acúmulo de água da chuva, encontrada no interior de bromélias ou em depressões no solo.

Formigueiro-do-litoral vive numa área muito restrita na Região dos Lagos

Distribuído exclusivamente na Região dos Lagos, com ocorrência registrada para os municípios de Saquarema, Araruama, Arraial do Cabo, São Pedro D’Aldeia, Cabo Frio e Iguaba Grande, o formigueiro-do-litoral está criticamente ameaçado de extinção. Nas áreas onde é encontrado, a espécie é abundante e persiste em áreas pequenas isoladas de habitat remanescente. No entanto acredita-se que a população total deva ser pequena, com grande declínio nos últimos anos, devido a expansão imobiliária, que destrói e fragmenta seu habitat, sendo a principal ameaça à sua sobrevivência.

Habitat da espécie está sendo substituído por empreendimentos imobiliários irregulares

Os pressupostos de desenvolvimento urbano mal planejado e a demanda turística crescente substituíram áreas de restingas por loteamentos irregulares, casas, clubes, condomínios e depósitos de lixo. A Região dos Lagos sofre intensas pressões antrópicas, que resultam na substituição de áreas de restinga, essenciais para a sobrevivência do formigueiro-do-litoral, por empreendimentos imobiliários.

Esforços estão sendo feitos para assegurar a sobrevivência da espécie

Em resposta a este desafio, a Sociedade para a Conservação das Aves do Brasil (SAVE Brasil) propôs o Plano de Ação Nacional para a Conservação do Formigueiro-do-litoral (PAN Formigueiro-do-litoral) em 2010. O plano, que se encerrou em 2016 com 63% das ações implementadas, visava manter a viabilidade populacional (genética e demográfica) do formigueiro-do-litoral. Após o encerramento deste PAN, a espécie foi incluída no Plano de Ação Nacional para Conservação de Aves da Mata Atlântica. Ambos os planos de ação foram fundamentais para indicar ações prioritárias envolvendo políticas públicas, pesquisa, comunicação e sensibilização, além do planejamento turístico e urbanístico da região.

O objetivo do Plano de Ação inicial era assegurar a conservação a longo prazo da espécie, já que a Área de Proteção Ambiental de Massambaba é a maior extensão de habitat adequado para formigueiro-da-restinga e, portanto, essencial para sua existência a longo prazo. No entanto, ainda falta à região áreas de proteção efetiva.


Áreas de proteção ambiental tem sido criadas em um esforço para manter o habitat do formigueiro-do-litoral

A Prefeitura do Município de Saquarema criou em 2008, criou a Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) Formigueiro do Litoral, nas margens do Canal Salgado, bairro de Jaconé, que entre seus objetivos explícitos no decreto de criação está o de “preservar espécies raras, endêmicas ou ameaçadas de extinção ou insuficientemente conhecidas da fauna e da flora nativas”. Na Região dos Lagos, em 2011, foi criado pelo governo do estado, o Parque Estadual da Costa do Sol que entre seus objetivos tem o de “assegurar a preservação dos remanescentes de Mata Atlântica e ecossistemas associados da região das baixadas litorâneas (restingas, mangues, lagoas, brejos, lagunas, entre outros), possibilitando a recuperação das áreas degradadas ali existentes”.

Machos da espécie tornam-se bastante agressivos com outros machos durante período reprodutivo

Com seu comportamento territorial, os machos do formigueiro-do-litoral podem se tornar bastante agressivos com outros machos que invadam seu território no período reprodutivo. Por sua vez, os ninhos dessa espécie são construídos em uma forquilha a cerca de 54 cm do solo, em forma de cesto, basicamente elaborado com fibras vegetais, cascas de árvores e teia de aranha. Lá, a fêmea deposita dois ovos brancos, e o casal alimenta os filhotes castanho-escuros, principalmente, com larvas, mariposas e ortópteros.

Também conhecido popularmente como "Com-com" ou "Conconha" na região de ocorrência, o formigueiro-do-litoral vive em meio à vegetação baixa, entre emaranhados de arbustos, onde se camufla, passando despercebido pela maioria das pessoas.

Preservar a existência desta espécie pequena e ameaçada requer atenção às pressões antrópicas no ambiente de restinga e aos esforços de conservação. A sobrevivência do Formigueiro-do-litoral depende diretamente da proteção de seu habitat único, ameaçado pela ocupação irregular e especulação imobiliária na região.

Fontes: Ebird, Wiki Aves, Brazilian Journal of Biology, PAN Formigueiro-do-litoral, UERJ, Mar Sem Fim, LabEcoAvesUerj,  SEB, OEco

Fotos: Formigueiro-do-litoral_macho_by Ciro Albano e segunda foto: Formigueiro-do-litoral_fêmea_by Sávio Freire Bruno