Novas populações descobertas do muriqui-do-sul aumentam suas chances de escapar da extinção



 


Os muriquis (Brachyteles) são os maiores primatas das Américas, endêmicos da Mata Atlântica, no Brasil. São reconhecidas duas espécies, o muriqui-do-sul (Brachyteles arachnoides) também conhecido como mono-carvoeiro e o muriqui-do-norte (Brachyteles hypoxanthus). Os Muriquis do norte são encontrados desde o noroeste do Rio de Janeiro até o sul da Bahia, incluindo os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo, e os Muriquis do sul são encontrados desde o sul do Rio de Janeiro até o norte do Paraná, incluindo Estado de São Paulo e uma pequena porção do Estado de Minas Gerais ao sul, na região da Serra da Mantiqueira.

Diferenças entre muriquis-do-sul e do Norte

As duas espécies de muriquis apresentam diferenças observáveis. Os muriquis do norte possuem faces e genitália manchadas de rosa e branco (despigmentadas) e polegar vestigial (vestígio de pouco ou nenhum uso), enquanto que as populações do sul tem a coloração facial e genital inteiramente preta e não possuem qualquer vestígio do polegar. Além disso, os muriquis do sul superam as espécies do norte por serem um pouco mais altos e um pouco mais pesados sendo assim, o muriqui-do-sul é verdadeiramente o maior primata das Américas.

Muriquis-do-sul são primatas sociais que vivem em grupos familiares que variam de 5 a 25 indivíduos. Pode medir em torno de 1m60, chegando até 15 quilos. Os muriquis cumprem importante papel ecológico, pois ajudam a regenerar seu ambiente florestal distribuindo sementes, através de suas fezes, dos muitos frutos que comem. Os muriquis podem ser predados pela onça-pintada (Panthera onca), onça-parda (Puma concolor), os indivíduos mais jovens podem ser predados por irara (Eira barbara) e grandes gaviões (Leptodon cayanensis).

Perda populacional do muriqui-do-sul foi substancial nos últimos anos

O muriqui-do-sul, está classificado como Criticamente em Perigo (CR) aparecendo na Lista Vermelha da IUCN de espécies ameaçadas. Nos últimos 60 anos (três gerações), a população total diminuiu 80%. A perda de habitat constituiu o principal fator de diminuição do número de muriquis-do-sul. A Mata Atlântica sofreu perdas significativas para a exploração madeireira, plantações de café, colheita ilegal de palmito, uso agrícola, pecuária, mineração em zonas de amortecimento de áreas protegidas e expansão urbana. A caça também tem sido ameaça à espécie. Os macacos são mortos tanto como fonte de alimento quanto por esporte.

Novas populações de muriquis-do-sul descobertas no Paraná

Embora a Mata Atlântica apresente um alto grau de desmatamento e sua maior parte está dividida em manchas, ou fragmentos de floresta isolados, continuam a ocorrer a descoberta de novas populações do muriqui-do-sul. Em artigo publicado em 2022, na revista Primate Conservation pesquisadores relatam que em busca feita entre 2019 e 2021 no Paraná encontraram 6 novas populações da espécie em três municípios que margeiam a bacia do Rio Ribeira de Iguape, Castro(Morro do Capim e Ribeira, Cerro Azul (Água Morna, Pinhalzinho e Pinhal Grande) e Campo Largo (Erva). Sendo que todos estavam em manchas florestais em propriedades privadas. Essas descobertas ampliaram o limite sul conhecido de distribuição geográfica da espécie.

O relato da descoberta dessas novas populações no Paraná tem grande importância, pois antes, em todo estado eram conhecidas somente quatro populações da espécie totalizando cerca de 38 indivíduos. Com as descobertas o estado passa a contar com dez populações de muriquis-do-sul, totalizando 62 indivíduos. No estado do Rio de Janeiro a população estimada é de menos de 400 indivíduos e no estado de São Paulo existem cerca de 950 exemplares. Portanto a população total dos muriquis-do-sul é maior que 1412 indivíduos, pois há pequena população no sul de Minas Gerais que pouco ampliaria esse número. Em todo o Brasil, apenas dois zoológicos abrigam muriquis-do-sul, em Curitiba e em Sorocaba (SP).

Muriquis-do-sul do Paraná vivem em sua maioria em áreas privadas

Essas novas populações do muriqui-do-sul foram encontradas em manchas florestais na região nordeste do Paraná intercaladas por extensas áreas de silvicultura, mineração, pastoreio e agricultura de subsistência. Esse cenário de fragmentação florestal também é encontrado em muitas localidades onde as populações de muriquis são encontradas em outras partes do Sudeste do Brasil ocorrendo em pequenas populações isoladas o que dificulta a possibilidade de sua conservação futura. A situação dos pequenos grupos existentes no Paraná é mais crítica, pois ao contrário das populações dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, onde a maioria habita áreas legalmente protegidas, a maioria dos grupos muriqui-do-sul registrados no estado do Paraná ocupa terras privadas.

A pesquisa que tornou possível encontrar essas novas populações do muriqui-do-sul no Paraná ocorreu dentro do Projeto de Conservação dos Monos no Paraná, realizado pelo Instituto de Ciência e Tecnologia (ICT) Lactec em parceria com a Copel e a Fundação Grupo Boticário.

No Sul de Minas Gerais uma nova população foi descoberta do muriqui-do-sul

A Mata Atlântica revelou, recentemente, novas surpresas em relação ao muriqui-do-sul. No sul de Minas Gerais, no Distrito de Monte Verde, município de Camundacaia, na Serra da Mantiqueira, em 2021 numa área de floresta nativa mantida pela Companhia Melhoramentos foi encontrada uma nova população da espécie, em 2022 novamente avistados 6 adultos e 1 filhote.  Em Minas Gerais, os muriquis-do-sul são encontrados ao longo das encostas sul da Serra da Mantiqueira.

População do mono-carvoeiro em São Paulo vive em áreas protegidas

Em São Paulo a Serra de Paranapiacaba, abriga a maior população da espécie, enquanto uma população remanescente vive ao longo dos deltas dos rios Piracicaba e Tietê, em São Paulo, na Fazenda Bacury, no município de Anhembi, uma reserva particular. A leste de São Paulo, entre Minas Gerais e Rio de Janeiro, os muriquis-do-sul residem na borda sul do rio Paraíba do Sul. Em São Paulo as áreas protegidas onde vivem os muriquis-do-sul incluem o Parque Estadual Serra do Mar, o Parque Estadual Carlos Botelho entre outros parques estaduais da Fundação Florestal Estadual de São Paulo. Em São Paulo, o Instituto  Pró-Muriqui desenvolve atividades de pesquisa sobre o muriqui-do-sul no Parque Estadual Carlos Botelho. Essa ONG foi criada em 2000 para garantir a continuidade das atividades de pesquisa dentro do Parque, onde a pesquisa de campo começou em 1986. Em 2014 o governo do Estado criou a Comissão Pro-Primatas Paulistas, comissão permanente responsável por elaborar políticas de conservação para ações estaduais sobre espécies de primatas ameaçadas.

No Rio de Janeiro experiência dos guardas florestais com as comunidades locais diminuíram a caça ao primata

No Rio de Janeiro a Reserva Ecológica de Guapiaçu (REGUA) abriga a maior população de muriquis-do-sul do Rio de Janeiro. Outras populações são encontradas no Parque Nacional do Itatiaia, no Parque Nacional da Serra dos Órgãos e no Parque Nacional da Bocaina. Um trabalho que obteve bons resultados foi realizado pelos guardas florestais da REGUA na última década. Esses guardas se envolveram com as comunidades locais através de programas de educação ambiental e obtiveram como resultado a diminuição acentuada da caça nessas áreas. Esse programa foi apoiado pela Keepers of the Wild (um programa do World Land Trust).

Os muriquis-do-sul vivem em maioria em áreas protegidas, só que isto não significa que estão seguros. Caçadores furtivos desrespeitam as leis e continuam a caça-los. O estabelecimento legal de reservas biológicas por si só não resolve o problema, há necessidade de maior conexão entre aqueles que trabalham nessas áreas protegidas e a comunidade local que vive no entorno, para que compartilhem a proteção dessas reservas.

Fontes: H2FOZ, NetZero, G1Globo (1), BioExplorer, New England Primate Conservancy, G1Globo (2), Lactec, Mais Expressão

Foto:Muriqui-do-sul_by Caio Ferreira