Boas perspectivas de salvamento do mico-leão-da-cara-dourada da extinção devido sua alta adaptabilidade a diversos habitats.


 O mico-leão-da-cara-dourada (Leontopithecus chrysomelas) ou mico-leão-baiano como também é conhecido, vive na Mata Atlântica no sul da Bahia e no nordeste de Minas Gerais (neste estado provavelmente está extinto). Ocorre no Rio de Janeiro como espécie invasora, tendo sido introduzido nesse estado por influência humana. É uma espécie avaliada como em perigo de extinção (EN) na Lista Vermelha da IUCN. A destruição, a degradação e fragmentação das florestas devem ser consideradas as principais causas de ameaça para a espécie.

A área de ocorrência original do mico-baiano estendia-se do rio de Contas ao rio Jequitinhonha, no Sul da Bahia, e ocupava uma pequena área no norte de Minas Gerais. Atualmente, a espécie encontra-se somente no Sul da Bahia. No limite oeste a área de distribuição é limitada pelo Planalto de Vitória da Conquista, na faixa de transição entre a Mata Atlântica e a Caatinga.

Mico-leão-baiano é o que tem a maior população entre todos os micos-leões

Os micos-leões-de-cara-dourada diferenciam-se dos outros micos-leões (dourado, preto e cara-preta) devido à coloração característica de sua pelagem. O corpo todo é de cor preta, com exceção da face, das mãos, dos pés e da ponta da cauda, que são de cor dourada. A cor da face pode variar de bege a preto. São animais de hábitos diurnos, que se movimentam pelos estratos altos da floresta na procura por alimento. Vivem em grupos de 3 até 15 indivíduos. São animais insetívoros e frugívoros. Vasculham bromélias na busca por frutos, folhas e invertebrados. Mais de 80% do seu tempo é dedicado à alimentação e gasto em bromélias. Além disso flores, néctar, seiva de árvores, insetos, aranhas, caracóis e sapos também fazem parte de seu cardápio.

As estimativas populacionais mais recentes colocam o número total de indivíduos maduros em menos de 2.500, assim sua população provavelmente está entre 11.000 e 15.000 indivíduos. A Reserva Biológica do UNA (REBIO-UNA)é a que tem a maior população desse primata, cerca de 1.100 exemplares, isso representa 250 ou mais indivíduos maduros. A população de micos-leões-da-cara-dourada é a maior entre todos os micos-leões. Uma das possibilidades que justificam a população mais numerosa entre os micos-leões-baianos é sua alta adaptabilidade a diversos ambientes de floresta.

Mico-leão-da-cara dourada é altamente adaptável a diversos ambientes florestais

A espécie foi a que melhor se adaptou à intervenção humana na paisagem. Não necessitando, como os outros micos-leões, de um ambiente maduro de floresta bem conservada para sobreviver.  Vive, inclusive, relativamente bem em área antropizada. Se reproduz muito bem nas áreas onde vigora o sistema de cabruca, que é um sistema agroflorestal de produção em que o cacau é cultivado sob a sombra de espécies nativas da floresta original. É devido a essa característica, que se adaptou muito bem, como espécie invasora, no Rio de Janeiro, se multiplicando rapidamente em poucos anos. 

Maior problema na conservação da espécie é alta fragmentação das florestas

Embora seus números sejam maiores do que as outras espécies de micos-leões, sua condição não consolida a viabilidade da espécie a longo prazo. Houve uma extrema redução da cobertura vegetal, fragmentação de habitats e a desconexão de habitats como resultado do aumento da matriz rodoviária ao longo de toda sua distribuição geográfica. Na sua área de ocorrência original, a espécie teve a presença comprovada em apenas uma Reserva Biológica a REBIO-UNA, um PARNA, algumas RPPNs, em especial a RPPN Ecoparque de Una, e 3 estações experimentais. O mico-leão-da-cara-dourada sofreu diversas extinções locais na porção sudoeste da Bahia e noroeste de Minas Gerais, sendo que neste último estado está provavelmente extinto.

Se adaptou muito bem no Estado do Rio de Janeiro tornando-se uma ameaça ao mico-leão-dourado

No Rio de Janeiro foram confirmadas populações no Parque Estadual da Serra da Tiririca-Peset e em Niterói onde a espécie é invasora. Na década de 1990, um morador da região de Niterói (no entorno do Parque Estadual da Serra da Tiririca-Peset) no RJ, soltou os micos-leões-da-cara-dourada que criava, e estes passaram a se reproduzir com sucesso na região, se espalhando tanto em áreas dentro da reserva como em fragmentos pequenos de mata dentro da região metropolitana de Niterói. O mico-leão-da-cara-dourada se estabeleceu acostumando-se rapidamente com o convívio humano. O maior perigo trazido por essa população de micos invasores era a hibridização com os micos-leões-dourados que viviam próximos dali. Se decidiu pela translocação da espécie invasora para erradicar a espécie no Parque Estadual Serra da Tiririca para que não venha a se expandir e começar a disputar território com a espécie nativa e ameaçada de extinção, que é o mico-leão-dourado. O grande perigo, se houvesse o encontro, seria a possível hibridação das espécies, possivelmente levando o nativo mico-leão-dourado à extinção.

Translocação dos micos-baianos do Rio de Janeiro para a Bahia obteve resultados positivos

Em 2007 foi fundada a ONG PRI-Matas (Instituto Primatas para a conservação da biodiversidade) que tinha entre seus objetivos realizar a remoção e translocação dos micos-leões-da-cara-dourada de Niterói, que embora ameaçados se apresentavam, na região, como uma espécie invasora. O projeto “Remoção e Translocação do Mico-Leão-da-Cara-Dourada (leontopithecus chrysomelas) capturou entre julho de 2012 a dezembro de 2013 o total de 741 micos, desses 293 exemplares foram translocados para o extremo sul da Bahia, região de Belmonte, numa área de fragmento florestal, parte de reserva legal que pertencia à Veracel Celulose. Para não superlotar a área e para aumentar as chances de sobrevivência e expansão das famílias que foram soltas na Bahia, alguns grupos de micos-leões-de-cara-dourada permaneceram em cativeiro e foram sendo encaminhados para Centro de Primatologia do Rio de Janeiro-CPRJ, zoológicos e outras instituições. Um dos problemas encontrados para a translocação foi a falta de fragmentos florestais para a reintrodução na natureza. As estimativas atuais dão conta de que, desde 2012, foram realocados cerca de 986 micos-leões-da-cara-dourada.

Parceria entre diversas instituições permitiu que fosse bem sucedida a operação de retirada dos micos invasores

O projeto de translocação do mico-leão-da-cara-dourada teve como instituições financiadoras a: Fundação Grupo Boticário de Proteção a Natureza, RBO Energia (através da Câmara de Compensação Ambiental do Rio de Janeiro), Lion Tamarin of Brazil Fund, Primate Action Fund, Margot Marsh Biodiversity Foundation, Tropical Forest Conservation Act TFCA/FUNBIO e MBZ Species Conservation Fund. Teve ainda o apoio do:  CPB/ICMBio; da Secretaria do Ambiente do Rio de Janeiro e do INEA; e das secretarias municipais de Meio Ambiente, Recursos Hídricos e Sustentabilidade e de Educação de Niterói.

Mico-leão-da-cara-dourada apresenta características que podem facilitar sua conservação

Embora a situação do mico-leão-da-cara-dourada ainda não seja a ideal, mantendo-se a perspectiva de extinção, a espécie tem fatores que possibilitam otimismo entre os conservacionistas. Este primata tem como característica sua alta adaptabilidade a diversos tipos de fragmentos florestais, e além disso possui uma população em cativeiro estabelecida e com grande número de fundadores que possibilitam para o futuro o desenvolvimento de programas de reintrodução em áreas monitoradas para aumentar a diversidade da sua população selvagem. Nesse sentido são fundamentais medidas como a criação de novas Unidades de Conservação, o aumento da fiscalização contra o desmatamento e a caça ilegal, além do aumento de pesquisas relacionadas com a biologia, comportamento, ecologia, genética, saúde e reprodução da espécie. É essencial priorizar nas estratégias de conservação a proteção dos remanescentes florestais e estabelecer a conectividade entre esses fragmentos. 

Fontes: Instituto Evandro Chagas, O Eco, Animal Diversity, Rewild Brazil, UESC, GBIF, Mongabay, Funbio (1), Cacau Chocolate, Exame, Funbio (2), INEA, Estadão, Meio Ambiente News, UNB, Instituto Pri-Matas

Foto: Mico-leão-da-cara-dourda_Sérgio Bavaresco