O zogue-zogue marrom (Plecturocebus brunneus) é um primata amazônico que se tornou uma das espécies mais emblemáticas da biodiversidade de Rondônia. Endêmico do estado, esse pequeno macaco tem sua distribuição restrita ao interflúvio dos rios Mamoré, Madeira e Jiparaná, com possível limite meridional na Serra dos Pacaás Novos. Sua condição de endemismo se consolidou após revisões taxonômicas recentes que o diferenciaram de populações do Peru, antes consideradas parte da mesma espécie. Hoje, o P. brunneus está sob forte pressão devido ao desmatamento, fragmentação de hábitat e caça, sendo classificado como ameaçado de extinção pelo ICMBio e como vulnerável na Lista Vermelha da IUCN.
Endemismo em Rondônia
Originalmente, acreditava-se que
populações no Peru, particularmente na região de Urubamba, pertenciam ao P.
brunneus. Entretanto, um estudo publicado em 2015 identificou que se
tratava de uma espécie distinta, o zogue-zogue marrom de Urubamba (Plecturocebus
urubambensis). Essa revisão taxonômica levou à confirmação de que o P.
brunneus é exclusivo do Brasil, ocorrendo apenas em Rondônia. A partir de
2016, passou a ser considerada uma espécie plenamente reconhecida e endêmica, o
que reforçou a importância das estratégias de conservação no território
rondoniense.
Características físicas e biológicas
Machos e fêmeas apresentam pesos
semelhantes, em torno de 1 kg, e comprimento corporal de 29 a 39 cm. Sua
expectativa de vida chega a 25 anos. A pelagem apresenta coloração agouti nas
costas, ombros e pernas, enquanto o ventre, pescoço e braços possuem tons
vermelho-ferrugem. Uma característica marcante é a “capa” preta sobre a cabeça
e orelhas. Apesar de arborícolas, possuem cauda não preênsil, utilizada para
equilíbrio, e mantêm postura encurvada, o que acentua o comprimento da cauda.
Os filhotes já nascem com a coloração adulta.
Ecologia e comportamento
O zogue-zogue marrom é
estritamente arborícola, deslocando-se em quatro patas e raramente descendo ao
solo. São animais diurnos que começam o dia alimentando-se intensamente e fazem
uma pausa ao meio-dia antes de retomar a forragem. Podem percorrer até 1,5 km
por dia em busca de alimento. Grupos familiares são pequenos, formados por um
casal monogâmico e seus descendentes, podendo reunir até cinco indivíduos. A
espécie apresenta comportamento social igualitário, com baixa incidência de
agressividade dentro dos grupos, mas podendo ocorrer confrontos entre famílias
distintas.
Dieta
Embora sejam predominantemente
frugívoros, sua dieta inclui folhas, sementes e invertebrados. Há variações
sazonais: na estação seca consomem mais folhas, enquanto fêmeas prenhes
aumentam a ingestão de insetos para suprir a necessidade de proteínas. Essa
plasticidade alimentar é fundamental para a sobrevivência em ambientes sujeitos
à degradação.
Reprodução e vida familiar
O P. brunneus está entre os
poucos primatas monogâmicos. As fêmeas dão à luz, geralmente entre
novembro e março, a um único filhote por vez. O cuidado parental é fortemente
marcado pela participação dos machos, que carregam os filhotes constantemente,
entregando-os à mãe apenas para amamentação. Os jovens permanecem no grupo até
os dois ou três anos de idade, quando, muitas vezes, são estimulados a sair com
a chegada de novos irmãos.
Comunicação e interações sociais
A espécie utiliza múltiplas formas
de comunicação: olfativa, por meio de glândulas no peito que deixam marcas
odoríferas em galhos; visual, por posturas corporais e expressões faciais;
acústica, por meio de uma ampla gama de vocalizações; e tátil, através da
limpeza recíproca. Os duetos ao nascer do sol, entoados por casais, são um
traço marcante de seu repertório vocal, servindo para demarcar território e
reforçar vínculos.
Papel ecológico e interações com
outras espécies
O zogue-zogue marrom
desempenha papel essencial na dispersão de sementes, contribuindo para a
regeneração florestal. Enfrenta predadores naturais, como aves de rapina e
serpentes arborícolas, além de conviver com outras espécies simpátricas de
primatas (espécies relacionadas que vivem na mesma área). Há registros de
competição direta com macacos-prego (Sapajus apella) e possíveis
interações de sobreposição territorial com o zogue-zogue de barriga vermelha (P.
moloch), sugerindo potenciais eventos de hibridização ainda não
confirmados.
Estado de conservação e ameaças
A espécie é classificada como vulnerável
pela IUCN e, mais recentemente, reconhecida como ameaçada de extinção
(categoria EN) pela Portaria ICMBio nº 1.565/2025. O principal fator de risco é
o desmatamento em Rondônia, estado que ocupa posições críticas no ranking da
Amazônia Legal em termos de supressão florestal. Entre 1996 e 2020, estima-se
que 27,4% de sua área de ocorrência tenha sido perdida. Essa redução, associada
à caça e captura, pode ter resultado em um declínio populacional de
aproximadamente 35%.
Além do avanço da fronteira
agrícola, a expansão de hidrelétricas, estradas e linhas de transmissão
fragmenta os habitats. Mesmo áreas protegidas, como o Parque Nacional Pacaás
Novos, a Floresta Nacional do Jamari e a Estação Ecológica Samuel, têm sofrido
invasões e degradação. A caça persiste em algumas terras indígenas, agravando a
vulnerabilidade da espécie.
Impactos regionais e mudanças climáticas
Rondônia já perdeu cerca de 22% de
sua cobertura florestal entre 2000 e 2018. Estudos sugerem que o desmatamento
altera o clima regional, provocando maior variabilidade de chuvas em áreas
abertas e aquecimento em florestas remanescentes. Essas alterações impactam
diretamente espécies dependentes de florestas contínuas, como o P. brunneus.
Adicionalmente, o aumento de 1,3°C na temperatura média anual do estado entre
1979 e 2023 intensifica os efeitos das mudanças climáticas, criando novos
desafios para sua sobrevivência.
Presença em áreas protegidas
Apesar das ameaças, o zogue-zogue
marrom ainda ocorre em diversas Unidades de Conservação em Rondônia, como o
Parque Nacional Pacaás Novos, a Reserva Biológica do Jaru, a Reserva
Extrativista do Rio Ouro Preto e a Estação Ecológica de Samuel. Essa presença
indica a importância estratégica dessas áreas para a manutenção da espécie,
embora sua eficácia dependa de maior fiscalização e políticas efetivas contra
invasões e desmatamento ilegal.
Esforços de conservação
A espécie está listada no Apêndice
II da CITES, que regula o comércio internacional de espécies ameaçadas. No
Brasil, esforços de conservação incluem a proteção legal em Unidades de
Conservação, monitoramento por órgãos ambientais e estudos científicos que
buscam compreender melhor sua ecologia. No entanto, a persistência das pressões
antrópicas demanda ações integradas, como a implementação de políticas
públicas mais rígidas contra o desmatamento, programas de restauração florestal
e iniciativas de conscientização junto às comunidades locais.
O zogue-zogue marrom é um exemplo
emblemático da fragilidade e da riqueza da biodiversidade amazônica. Sua
condição de endemismo em Rondônia reforça a urgência de estratégias
específicas de conservação no estado, que enfrenta taxas alarmantes de
desmatamento e degradação ambiental. Sem medidas efetivas de
proteção, restauração de hábitat e controle da caça, a espécie poderá ter seu
futuro comprometido.
Fontes: New Primate Conservation,
Salve.ICMBio, Primate Conservation, ICMBio, Portaria ICMBio Nº 1.565, de 24 de abril
de 2025
Fotos: Zogue-zogue marrom_by Artur Cuca; segunda foto:_by Rick Costa; terceira foto: Cheryl Antonucci e quarta foto:_by Glauko Corrêa



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