Biologia, distribuição e conservação do mutum-de-fava na Amazônica Ocidental


O mutum-de-fava (Crax globulosa), também conhecido como mutum-açu, mutum-de-assovio e mutum-piuri, é uma espécie de ave galliforme pertencente à família Cracidae, considerada uma das mais ameaçadas dos Neotrópicos. Reconhecido por sua plumagem marcante e ornamentos faciais únicos, o mutum-de-fava enfrenta severas ameaças devido à caça e perda de habitat, sendo atualmente classificado como "em perigo" pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).

Características biológicas

O mutum-de-fava é uma ave de grande porte, medindo entre 82 e 89 cm de comprimento e pesando cerca de 2,5 kg. Os machos possuem plumagem preta, ventre branco, e um ornamento facial característico: uma carúncula vermelha esférica na base do bico e pequenas barbelas vermelhas na mandíbula. A fêmea exibe características distintas, como ventre ferruginoso e ausência de ornamentos no bico, que possui coloração vermelho-alaranjada. Juvenis e filhotes apresentam padrões mais discretos, sendo marrons na parte superior e esbranquiçados na parte inferior.

A dieta dessa espécie é composta principalmente por frutas, sementes, invertebrados e pequenos vertebrados. Durante a estação seca, quando a área de terra firme aumenta, é possível observá-lo forrageando no chão. Já na estação chuvosa, utiliza o estrato arbóreo das florestas de várzea inundadas, demonstrando uma alta adaptabilidade aos diferentes períodos do ano.

Distribuição geográfica e habitat

O mutum-de-fava é endêmico da bacia amazônica ocidental, com registros no Brasil, Bolívia, Colômbia, Peru e, anteriormente, Equador. Apesar de sua ampla distribuição, as populações são descontínuas, com subpopulações geralmente limitadas a menos de 250 indivíduos. No Brasil, ocorre principalmente no estado do Amazonas, sendo mais abundante na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá.

O habitat preferencial do mutum-de-fava são as florestas de várzea sazonalmente inundadas e ilhas fluviais de rios de água branca. Essas áreas, caracterizadas pela alta oferta de recursos alimentares, são fundamentais para sua sobrevivência. Contudo, a proximidade com corpos d’água torna a espécie altamente vulnerável à caça e ao desmatamento, que têm contribuído para o declínio populacional.

Ameaças à sobrevivência

As principais ameaças ao mutum-de-fava incluem a caça para subsistência e comércio, e a perda de habitat devido ao avanço da agricultura e atividades madeireiras. A espécie é especialmente vulnerável por estar restrita a habitats próximos a rios, facilmente acessíveis por comunidades humanas que utilizam essas áreas para transporte e subsistência.

Estima-se que a população atual da espécie seja inferior a 10.000 indivíduos adultos, podendo ser ainda menor. Em áreas como o Equador, a espécie já é considerada extinta localmente. Além disso, projeções indicam que até 30,5% de seu habitat pode ser perdido ao longo de três gerações devido ao desmatamento na Amazônia.

Esforços de conservação

Diversas iniciativas têm sido implementadas para proteger o mutum-de-fava. Ele está listado como ameaçado nos países de sua ocorrência, sendo classificado como criticamente ameaçado na Bolívia e Peru e possivelmente extinto no Equador. A espécie é encontrada em áreas protegidas como as Reservas de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá e Amanã no Brasil, a Reserva Nacional Pacaya-Samiria no Peru e a Reserva Indígena Takana III na Bolívia.

Campanhas de conscientização têm reduzido significativamente a pressão de caça em algumas regiões. Na Bolívia, programas educacionais e a implementação de alternativas de subsistência, como o ecoturismo comunitário, têm mostrado resultados positivos. Apesar disso, a espécie ainda carece de proteção legal mais ampla e de monitoramento populacional contínuo. A espécie é criada em cativeiro, com sucesso, por vários zoológicos garantindo a existência de população de segurança para possíveis reintroduções futuras.

O mutum-de-fava é um símbolo da riqueza e fragilidade dos ecossistemas amazônicos. Embora ameaçado, o comprometimento com ações de conservação pode garantir a sobrevivência desta espécie no longo prazo. A continuidade de esforços integrados, envolvendo comunidades locais, governos e organizações não governamentais, é essencial para reverter o declínio populacional e assegurar a sua preservação.

Fontes: WikiAves, BirdLife International, PeruAves, Sibbr, Springer, INPA, Ebird, Biodiversity4all 

Fotos: Mutum-de-Fava_ macho_by Rohan van Twest e segunda foto: Mutum-de-Fava_fêmea_ by Tom Friedel