Uma
espécie de ave única que reside principalmente nas águas do Lago Titicaca,
o mergulhão-do-titicaca (Rollandia microptera) tem seu habitat
nos rios e lagos adjacentes da Bolívia e do Peru. Esta ave aquática, ao
contrário da maioria de seus congêneres, não possui a capacidade de voar. No
entanto, demonstra habilidades notáveis de natação e até uma corrida peculiar,
auxiliada pelo movimento de suas pequenas asas.
Os
mergulhões-do-titicaca variam de cor durante o período reprodutivo
Este
pequeno e delgado pássaro, com um comprimento médio de 40cm e um peso
ligeiramente acima de meio quilo, apresenta uma plumagem principalmente marrom.
A cor da cabeça oscila entre um gorro escuro, que se estende até as bochechas,
e uma nuca de tonalidade marrom mais escura. No período reprodutivo, eles
adquirem garganta, bochechas e pescoço brancos, contrastando com a coroa e a
nuca cor de canela. No entanto, na época não reprodutiva, eles se tornam mais
pálidos e descoloridos.
Os
mergulhões-do-titicaca apresentam uma organização social complexa. Eles
estabelecem territórios de reprodução, aparentando serem bastante sedentários.
Os ninhos da espécie são encontrados durante todo o ano, porém, eles têm um
pico reprodutivo entre novembro e dezembro. Seu ciclo reprodutivo gera, em
geral, dois ovos por ninhada, com duas ninhadas por ano.
Espécie
é encontrada em áreas dominadas pela vegetação da planta totora
Em
termos de habitat, a espécie está associada a um mosaico de ambientes abertos e
unidades de vegetação chamadas "totorales", dominadas pela planta
Totora, usadas
como áreas principais de nidificação. Esta ave é predominantemente encontrada
em La Paz e Oruro, acima de 3.700 metros, dentro da bacia do Lago Titicaca, uma
zona correspondente às ecorregiões da puna
do norte e do sul. No
entanto, esta espécie também pode ser observada em áreas com alta perturbação e
contaminação humana, embora em menor grau.
População
do mergulhão-do-titicaca é reduzida e esta em declínio
Os
mergulhões-do-titicaca, têm uma dieta variada, composta principalmente
por peixes, gastrópodes aquáticos, e ocasionalmente, sapos. Porém, esta dieta
variada não tem sido suficiente para protegê-los da ameaça de extinção. Segundo
a União
Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), a espécie é classificada como ameaçada, com
uma população estimada de menos de 750 adultos e em declínio. Este decréscimo populacional é preocupante,
dado que o mergulhão-do-titicaca, ou zampullín del Titicaca, como
é localmente conhecido, é uma espécie fortemente impactada e sensível às
mudanças ambientais. Ele é totalmente incapaz de voar, usando apenas as
asas para auxiliar em corridas consideráveis na água, mas é um excelente
mergulhador, capaz de atingir velocidades de até 3,5 km/h.
Várias
ameaças diretas e indiretas ameaçam a sobrevivência deste mergulhão
A
precária situação desta espécie é agravada por várias ameaças diretas e
indiretas. Diretamente, a ave enfrenta o perigo de captura acidental em
redes de pescadores, coleta de ovos e perturbação e perda de habitat devido
à colheita e queima de totora, planta vital para a nidificação da espécie.
Indiretamente, fatores como a introdução de espécies exóticas, que
alteram a oferta e a competição por recursos alimentares, e as alterações na
gestão das bacias de alguns setores do Rio Desaguadero para fins de
agricultura, transporte fluvial e controle do fluxo de água também afetam o mergulhão-do-titicaca.
A contaminação da água por resíduos orgânicos e inorgânicos decorrentes de atividades
de mineração em alguns setores, como entre Bella Vista e a Mina
Kori Kollo, é outra
ameaça que a espécie enfrenta. Por fim, o crescimento exponencial e desordenado
das atividades turísticas no setor do Lago Titicaca também tem
contribuído para a ameaça à espécie.
Ainda
são poucos os estudos sobre a espécie
Em
contrapartida, embora a nível nacional não existam medidas de conservação, há
um esforço para entender mais sobre a biologia da espécie e seu habitat. Essas
informações servirão de base para a criação de um Plano de Conservação da
espécie em nível nacional. Além disso, há trabalho em progresso na
formulação de planos comunitários de conservação que visam a conservação do seu
habitat. Entretanto,
desde 2003, não foram publicados estudos atualizados sobre a população do mergulhão-do-titicaca
ou a extensão desses pântanos totora na região do Lago Titicaca.
Associações lideram os esforços na conservação do mergulhão-do-titicaca
Grupos
de conservação também estão se mobilizando para proteger o mergulhão. A Associação Armonia, por exemplo, trabalha para proteger o
habitat da ave no pantanal do Lago Poopó, um dos locais mais importantes para a
espécie, ameaçado pela mineração, resíduos tóxicos da indústria e pesca
predatória. Em parceria com o Centro de Estudos de Biologia Teórica e Aplicada
(BIOTA), Armonía já desenvolveu um plano de ação para reduzir o impacto das
atividades humanas no Lago Poopó e está agora implementando esse plano, com o
apoio da BirdLife International e do US
Fish and Wildlife Service.
Plano
de conservação envolvendo diversos atores locais e nacionais é a proposta mais
viável
Essas
organizações propõem o desenvolvimento de um Plano de Conservação em conjunto
com os atores locais e nacionais, que visa um manejo sustentável do ecossistema
do mergulhão-do-titicaca. Os temas desse plano incluem a redução da
captura incidental em redes de pescadores, programas de desenvolvimento e
manejo sustentável no entorno da distribuição da espécie, a formulação de
políticas públicas e legislação para estabelecer e fortalecer unidades de
conservação locais para a espécie e seu habitat, e planos de gestão do turismo.
Importante
para a conservação do mergulhão é a cooperação binacional entre Peru e Bolívia
Em
2019, as delegações da Bolívia e do Peru realizaram uma reunião em La Paz para
discutir a situação do mergulhão-do-titicaca, no Workshop
"Ações para a conservação de espécies indicadoras: Rollandia microptera no
sistema hídrico Titicaca-Desagüadero-Poopó-Salar de Coipasa (TDPS) que inclui
os lagos Titicaca, Poopó e uru uru”, que integra o projeto binacional “Gestión integrada de los recursos hídricos en
el sistema titicaca-desaguadero-poopó-salar de coipasa (girh-tdps)” apoiado
pelo Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD).
Parceria
com as comunidades que vivem e dependem do lago Titicaca é vital para a
sobrevivência do mergulhão
A
conservação do mergulhão-do-titicaca e de seu habitat é uma questão
complexa e interdependente, que interfere nos fundamentos da economia local, no
manejo dos recursos naturais e na governança ambiental. Muitas
comunidades dependem diretamente do lago e de seus ecossistemas para sua
sobrevivência, seja por meio da pesca, agricultura ou turismo. Portanto,
quaisquer esforços para proteger este habitat precisam levar em consideração os
direitos e necessidades dessas comunidades, garantindo que eles sejam parceiros
na conservação.
Educação
ambiental e pesquisa científica são medidas que devem ser adotadas na proteção
da espécie
A
educação ambiental é outra importante ferramenta nesse esforço. Escolas,
comunidades e grupos de interesse devem ser orientados sobre a importância do mergulhão-do-titicaca
e seu ecossistema. Ao compreender o valor dessas aves e o delicado equilíbrio
do habitat em que vivem, a população local pode se tornar um ator-chave na sua
proteção. A pesquisa científica, também, é cada vez mais necessária para
melhorar a compreensão sobre o mergulhão-do-titicaca, sua ecologia, seu
comportamento e suas necessidades, para desenvolver estratégias de conservação
eficazes.
A
cooperação internacional será fundamental para o sucesso desses esforços. O
lago Titicaca se estende entre a Bolívia e o Peru, portanto, a conservação
desse habitat exigirá uma coordenação entre esses dois países. Organizações
internacionais de conservação, também têm um papel importante a desempenhar,
oferecendo recursos e expertise. É importante que todos os envolvidos compreendam
que lutar pela conservação do mergulhão-do-titicaca é uma luta pela
saúde do Lago Titicaca e pelas comunidades que dependem dele.
Fontes:
Conservation
International, Ebird, Birdlife
International, Peru Aves, Associação
Armonia, Bird
Conservation International, Birds of
Bolivia, Scientificlib, Grupo
Spazio, Girh-Tdps
Fotos: Mergulhão do Titicaca_by Ryan O'Donell e segunda foto: Mergulhão do Titicaca_by Sjoerd Schimmel