Duas espécies de sagui-da-serra estão próximas da extinção na natureza


A conceituada publicação Primates in Peril que divulga a cada dois anos os 25 primatas mais ameaçados do mundo tem alertado sobre a crítica situação em que vivem os saguis-da serra, espécies endêmicas da Mata Atlântica brasileira. Neste ano foi publicada a relação correspondente ao biênio 2022-2023 com a presença renovada do sagui-da-serra-claro (Callithrix flaviceps) incluído na listagem pela quarta vez. No biênio anterior 2018-2020 estava relacionado o sagui-da-serra-escuro (Callithrix aurita) que só não foi incluído neste ano porque deu lugar ao C. flaviceps que tem uma população menor e vive em área muito restrita e está na Lista Vermelha da IUCN como “Criticamente Ameaçado” enquanto o C. aurita está na Lista como “Em Perigo (EN)” de extinção tendo uma distribuição mais ampla e população maior.  

Espécie mais ameaçada é o sagui-da-serra-claro com nenhum exemplar em cativeiro

O sagui-da-serra-claro (Callithrix flaviceps) também conhecido como sagui-taquara é um pequeno primata de cerca de 400 gramas de peso, endêmico da Mata Atlântica brasileira. Possui coloração geral do corpo castanho-acinzentado-claro, sendo que a cabeça, pescoço e face são beges-amareladas e seus tufos auriculares são amarelados e curtos. Tem uma distribuição geográfica muito restrita. Ocorre atualmente em populações reduzidas e isoladas em fragmentos de floresta, sempre acima de 500 metros nas regiões de Mata Atlântica do estado do Espírito Santo (centro sudoeste e região serrana) e em pequenas áreas adjacentes à leste de Minas Gerais e extremo norte do Rio de Janeiro. Na área em que vive a floresta é extremamente fragmentada devido à expansão da agricultura, pecuária, plantio de árvores (Eucalipto), urbanização, mineração e construção de barragens.  Estima-se uma população total de 4.440 indivíduos, composta por menos de 2.500 indivíduos maduros. Até o momento, não há exemplares em cativeiro. Neste ano estão previstas pelo Centro de Conservação dos Saguis-da-Serra (CCSS) ações de resgate de exemplares com a expectativa de ter no mínimo 3 a 5 casais para iniciar uma colônia em cativeiro.

As maiores áreas protegidas onde a espécie ocorre são o Parque Nacional do Caparaó, a Reserva Biológica Augusto Ruschi, o Parque Estadual do Rio Doce e a Reserva Estadual Pedra Azul. Também está presente em uma série de reservas privadas, incluindo a Estação Biológica de Caratinga/RPPN Feliciano Miguel Abdala e a RPPN Mata do Sossego.

Há mais estudos e pesquisas sobre o sagui-da-serra-escuro e existem exemplares em cativeiro

O sagui-da-serra-escuro (Callithrix aurita) é um pequeno macaco com pelagem, predominantemente, negra e que tem uma aparência curiosa em virtude de seu rosto apresentar uma máscara branca, semelhante a uma caveira e que lhe rendeu o outro nome pelo qual é conhecido, “sagui-caveirinha.” É endêmico da Mata Atlântica brasileira. Habita as cadeias montanhosas da região Sudeste, nos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e leste e nordeste de São Paulo. Seu peso aproximado é de 420 gramas.

A população total de adultos da espécie é estimada em cerca de 10.000 indivíduos, tendendo ao declínio. Atualmente, existem 55 indivíduos de Callithrix aurita em cativeiro. Além do Centro de Conservação dos Saguis-da-Serra (CCSS), há grupos em outras quatro instituições: no Centro de Primatologia do Rio de Janeiro (CPRJ) e no Zoológico de Guarulhos, os primeiros a manejarem a espécie em cativeiro; no Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (CRAS) da Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP) e no Centro de Pesquisa e Conservação de Fauna (CECFau) da Fundação Zoológico de São Paulo.

Principal ameaça às duas espécies é a intensa hibridização com espécies exóticas invasoras

A situação dessas duas espécies de saguis-da-serra é de extrema preocupação porque além das ameaças comuns que afetam os primatas, como a destruição do habitat e fragmentação devido a expansão urbana, à exploração agrícola e pecuária, incêndios florestais, a disseminação de doenças como a febre amarela e a caça, há a séria ameaça da competição e hibridização com espécies de sagui exóticas e invasoras do Nordeste e Cerrado brasileiro.

O tráfico de animais é o responsável pela introdução das espécies exóticas do Nordeste, o sagui-de-tufo-branco (Callithrix jacchus) e do Cerrado,o sagui-de-tufo-preto (Callithrix penicillata) na Mata Atlântica do sudeste do Brasil. Essas espécies invasoras foram intensamente traficadas nas décadas de 1980 e 90 e se espalharam nas áreas onde vivem os saguis-da-serra. Os primatas invasores vieram de biomas mais quentes e secos como a caatinga e o cerrado e ao se depararem com florestas com abundância de frutos e abrigo se multiplicaram de forma avassaladora, e além de competir com os saguis-da-serra por espaço e recursos hibridizaram com estes, gerando descendentes férteis. Esse processo de hibridização ocorre em grande velocidade, de tal modo que hoje em dia, segundo pesquisadores, encontrar animais de genética pura entre os saguis-da-serra é uma tarefa árdua.

Centro de conservação de saguis-da-serra visa manter exemplares geneticamente puros das duas espécies

A principal iniciativa de salvar os saguis-da-serra está numa parceria estabelecida entre a Universidade Federal de Viçosa (UFV) e o Programa de Conservação dos Saguis-da-Serra – PCMM. Dessa cooperação surgiu o Centro de Conservação dos Saguis-da-serra da Universidade Federal de Viçosa – CCSS-UFV que tem o objetivo de estabelecer populações geneticamente puras em cativeiro das duas espécies de saguis-da-serra para posterior programa de soltura em áreas potenciais para repovoamento, livres de espécies invasoras. Essa iniciativa conta com o apoio de instituições nacionais e internacionais como a Durrell Wildlife Conservation Trust, Apenheul Zoo, ZooParc de Beauval, ONG PREA, Mata Nativa e Zoológico de Guarulhos.

Fonte: Mata Nativa (1), Mata Nativa (2), O Eco (1), Programa de Conservação dos Saguis da Serra, Ecycle, Mongabay (1), Diário do Aço, O Eco (2), Primates in Peril (1), Primates in Peril (2), Ambiente Brasil, Mata Nativa (3), Mongabay (2)

Fotos: Sagui-da-serra-claro_Sarisha Trindade e Sagui-da-serra-escuro_Marco Silva